A aprovação da reforma tributária no Brasil, especialmente através do Projeto de Lei Complementar nº 68/2024 (PLP 68/24), tem gerado diversas preocupações entre especialistas e atores do setor imobiliário, particularmente no segmento de loteamentos. Este artigo explora as possíveis consequências desse cenário para o mercado e destaca a necessidade de um ambiente tributário mais favorável para preservar empregos e incentivar o desenvolvimento urbano.
Impactos Econômicos e Sociais da Reforma
A principal preocupação dos especialistas é o aumento considerável na carga tributária que pode resultar da aprovação do PLP 68/24. Esse aumento pode ter vários efeitos negativos, incluindo a elevação dos preços finais dos imóveis, o que prejudica o desenvolvimento de novos loteamentos e afeta o mercado de forma geral.
Flávio Guerra, presidente da Associação de Empresas de Loteamento Urbano de Minas Gerais (Aelo/MG) e vice-presidente do Sinduscon-MG, destaca a gravidade da situação: “No final do dia, sabemos que o cliente final será impactado. Por isso, precisamos trabalhar em prol de um ambiente tributário mais favorável para toda a cadeia produtiva do mercado imobiliário, incluindo o mercado de loteamentos. Estamos falando de centenas de milhares de empregos que podem ficar em risco.” A fala de Guerra enfatiza a importância de políticas tributárias que considerem as especificidades do setor de loteamentos para evitar um impacto negativo significativo na economia.
A Natureza Única do Mercado Imobiliário
Caio Portugal, presidente da Associação de Empresas de Loteamento Urbano (Aelo) e vice-presidente do Secovi/SP, reforça a necessidade de uma revisão na reforma tributária, considerando as peculiaridades do setor imobiliário. Segundo ele, “A atividade imobiliária não é industrial e nem de serviços. Trata-se de uma atividade em que o bem não se consome. Um terreno e sempre será um terreno, mesmo se ali for construída uma casa que, anos depois, vai dar lugar a um prédio.”
Além disso, Caio destaca que a infraestrutura necessária para um loteamento, como redes de saneamento e eletrificação, permanece como legado mesmo após mudanças de uso do solo. Essa característica única do setor imobiliário justifica um tratamento tributário diferenciado. Em muitos países que adotam o Imposto sobre Valor Agregado (IVA), como é o caso do Brasil com a nova reforma, há um tratamento específico para operações imobiliárias para garantir a não cumulatividade ao longo do ciclo de produção e consumo de um imóvel.
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Consequências no Desenvolvimento de Loteamentos
O impacto da reforma tributária também é sentido diretamente no desenvolvimento de novos projetos de loteamento. Com a alta de 77,81% nos preços dos imóveis desde 2020, conforme o Índice Geral do Mercado Imobiliário Residencial (IGMI-R) da Abecip-FGV, o aumento da carga tributária pode desestimular investidores e dificultar o acesso à moradia para famílias de diferentes faixas de renda.
A primeira fase da Reforma Tributária, aprovada no final de 2023, trouxe algumas mudanças importantes para o setor, como o estabelecimento de um “regime específico” que exclui o setor imobiliário do “regime geral do IVA”. No entanto, o texto da reforma ainda propõe uma alíquota para operações com bens imóveis que não atende completamente às necessidades do setor.
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A Importância do Setor de Loteamentos na Economia Brasileira
O setor de loteamento e desenvolvimento urbano desempenha um papel crucial na economia brasileira. Um estudo realizado pela consultoria Econit revela que o PIB total da cadeia da construção, incluindo todos os seus elos, foi de R$ 534,3 bilhões em 2022. O valor agregado do setor de loteamento e desenvolvimento urbano, por sua vez, foi de R$ 4,9 bilhões, representando quase 1% do PIB.
Além de sua importância econômica direta, o setor de loteamentos contribui significativamente para a arrecadação municipal por meio do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU). A atividade de loteamento também ajuda a aliviar os cofres públicos municipais ao arcar com os custos de infraestrutura, compensação ambiental e outras contrapartidas que poderiam recair sobre as prefeituras.
Soluções Possíveis e o Caminho a Seguir
Diante dos desafios impostos pela reforma tributária, é essencial que o governo e as entidades do setor continuem dialogando para encontrar soluções que preservem a competitividade do mercado imobiliário e o acesso à moradia. Ana Maria Castelo, economista da Fundação Getúlio Vargas/IBRE, destaca a necessidade de um equilíbrio: “O setor de loteamentos, vital para a expansão urbana e o desenvolvimento habitacional no Brasil, encontra-se diante de um desafio crítico com a nova reforma tributária. A alíquota proposta no PLP 68/24, ao não considerar as especificidades do mercado imobiliário, pode desencadear um aumento nos preços dos imóveis, impactando negativamente tanto o setor quanto os consumidores.”
A proposta é de que se busque uma alíquota mais justa e um tratamento tributário diferenciado para o setor, que leve em consideração suas características únicas e seu impacto na economia e no desenvolvimento urbano. Além disso, é necessário criar incentivos que estimulem o investimento e garantam o acesso à moradia para todas as faixas de renda, promovendo um crescimento sustentável e inclusivo para o país.
Conclusão
A reforma tributária proposta pelo PLP 68/24 traz desafios significativos para o mercado de loteamentos e para o setor imobiliário como um todo. No entanto, com um diálogo contínuo entre governo e entidades do setor, é possível encontrar soluções que equilibrem a necessidade de arrecadação com o desenvolvimento econômico e social. O objetivo deve ser sempre promover um ambiente favorável ao crescimento, preservando empregos e garantindo o acesso à moradia para todos.